Falsos Pensares



Vivo com falsos pensares;
Risco tormentos; cegares
Piscam os olhos, de manso;
Subo montanha de um lanço;

Tenho depressa como alvo;
Vejo a neblina, ressalvo;
Como pensar, se ciúme
Rói por demais a matéria,

Feita de carne com ossos?
Rude e suspeita venérea
Rompe os grilhões de colossos.

Brota pacato azedume.
Tudo depõe-me faminto;
Tudo de pânico sinto.

Autor: Edigles Guedes.


Dizes Adeus



Quando me dizes adeus,
Algo me põe de sandeu…
Mágoa será que rompeu?…
Trégua na língua gemeu?…

Houve um desvairo nos mares…
Ah! se me louca brigares,
Serei feliz com a sina;
Porém, você me previna,

Caso desgoste de mim.
Eu, que desvivo sem ti,
Decido ter o adeus
Debaixo, rude, dos pés.

Antes chorar com desgosto,
Que ver partir ao sol-posto.

Autor: Edigles Guedes.


Vida Sonha



Desdobra as asas,
Em voo largo…
Partiu amargo
O peito alado

De Dama linda.
Verão de sol
Ardente, finda

O dia, fado
Sorri. Lençol
Me cobre o lado.

A língua abrasa…
— A vida sonha
Em psiu de fronha…

Autor: Edigles Guedes.


Mágoa



Sombrinha tácita, na mão,
Girava aquém, girava além…
O pé, depressa, faz alguém
De leso — cisma que brotava

No meu regaço; vegetava
Por siso afora, de bufão.
Gozar o beijo por vintém?
Sonhar que pode; intervém,

Porém, donzela com vergonha.
Acanho viça; mas, proponha
Um dócil ósculo na fronte,
Àquela, não que desaponte…

Justo é que pague com chorar,
Quem tanta mágoa deflorar.

Autor: Edigles Guedes.


Livro, Monólogo



Um livro sem prólogo
De páginas todas
Antigas, de mofo
Excessivamente

A superlotada…
As traças que fogem
Das folhas ao soalho…

Um lindo monólogo,
De si pra consigo…
E eu filosofo
Um pouco, com mente

Tristonha, calcada
Em livro que dorme,
Na estante da fome…

Autor: Edigles Guedes.


Tivéssemos Asas



Ah! se tivéssemos asas,
Como os pássaros!… Casas
Faremos, de galho em galho…
Seremos felizes, caro

Amigo do tempo oblíquo…
Saudade faria morada
Em nosso peito perspícuo?…
A mágoa voaria pra longe…

A lágrima sorriria
De felicidade pia…
Ousaria alguma tristura

Despertar-nos da quimera?…
Viveremos sem amargura,
Tão segura na moldura…

Autor: Edigles Guedes.


Gravura da Aurora



A dúbia esperança
Que traz-me bonança,
Em noite penosa;
Se bem que de rosa

Pintou o azul
Sidéreo. No sul,
Cruzeiro fulgura!

Aurora, há pouco,
Raiou, no sufoco.
Conversa vertia,
Robusta de pia.

Labuta sorri.
Ventura cuspi.
Notável gravura!

Autor: Edigles Guedes.


Perfume de Sonho



O sonho a sonhar-te…
Te fez um favor:
Encheu-te de carne…
Restou, com amor,

O lábio de flor…
Cativo, contigo
Me firo; doído,
Me giro; castigo

De afeto com dor…
Evola perfume
De ti, que consume

Um beijo perdido,
Em rosto cingido
De cinza e calor…

Autor: Edigles Guedes.


Sentires



Imensas agonias:
Cabelos pinicados
Me deixam furibundo,
Talvez um de complexo

Sansão. Acaricias
O rosto, malbarato
Amor, de vagabundo
Andar, de circunflexo

Olhar, de carbonato
Tatear, de literato
Ouvir, em errabundo

Trautear! Acabrunhados
Sentires de sujeito
Desperto, que rejeito.

Autor: Edigles Guedes.


Perante Rio de Sentimentos



Danou-se, atrevido!
Que mão indiscreta!
Capaz de, sorrindo,
Poupar a secreta

Escolha de beijo
Na face inconsútil!
Me sinto tão fútil;
Mas sigo, sofrente.

Avante! que atrás
A gente vem logo.
O beijo não dás.

A lei que revogo:
Um rio contente
Me faz o que sente?

Autor: Edigles Guedes.


No Baixel



Baixel que navega
Por mares, calado.
Me lembra serôdio,
Tristonho passado,

E cinjo-me: cinto
De prata, brunido;
Sapatos de couro
Retinto. Sonido

Me bota de louro
Cabelo tão pouco.
Caminho tão rouco.

A fúria me cega.
O mar que me pega,
Sacode-me. Chega!

Autor: Edigles Guedes.


Quebranto



Deserto daquela
Me quis cabisbaixo.
Mas sou contrabaixo
De cor amarela.

Suspiro desata
Um nó de bastardo
Viver, que galhardo
Me poupo pra data

Propícia ao pranto.
Por isso vocábulo
Ribomba: eu canto!

Por isso retábulo
Encanta: suplanto
Maciço quebranto!

Autor: Edigles Guedes.


Favorita



O mar cobiçando
Das ondas, fineza.
O lar dardejando
A flecha mui tesa.

Saudade liberta,
Mas sigo por certa
A rota que tira
A mágoa. De lira

Em punho, chilreio
Cantiga. Passeio
Por nau singular.

O calo me grita
Do pé. Favorita
A mão por versar.

Autor: Edigles Guedes.


Que Deu?



O marco
Cobiça.
O barco
Enguiça.

Manhã
De fúria.
Maçã
Espúria.

Secura
Perdura
Na língua.

À míngua,
E eu,
Que deu?

Autor: Edigles Guedes.


Mar em Fúria



O túrbido mar, que canoras as ondas
Se vão triturando, rasgões, hediondas
As vozes das águas em fúria gigante.
Agita desânimo dentro da gente.

Carótida pulsa com medo faiscante.
O corpo, de mórbido, estático; sente
As pernas, de trêmulas, tácitas; quente,

O ventre carece de pulo por boca
Afora; suor escorrega por face,
Agora; bastante gagueja por mouca
A mente. Sossego que tanto me lace

No tempo de duro perigo flagrante!
Cabelos de mar? Evadidos. Demente,
Se dana com náufrago o barco decente.

Autor: Edigles Guedes.


Riso de Escárnio



De muitos os sonhos, que tive pequeno,
Se foram depressa. Disseram adeus?
Asinha partiram, e, sim, me deixaram
Com tanto salgado na língua. Museus

De tralhas, gargalo de micos longínquos,
Me torno. Respiro profundo, retomo
O fôlego. Voz desvanece nos ares.

Me lembro de tempos pretéritos, vivos
Em quengo desperto, capaz de sorrisos
Imensos: a praça nutrida de gentes;
As pipas que voam; pipocas assadas;

Os peixes, em tanque; domingos no parque.
Mas tudo se foi. Desembrulha a quimera
Um riso de escárnio; vagido vertera.

Autor: Edigles Guedes.


Desaforo



Não me faça desaforo!
Não tolero desatino!
Não suporto violino,
Como canto duradouro,

Numa tarde graciosa!
Onde fica o sentimento,
Já crescido no tormento?
Terra bruta e preciosa

É capaz de partejar
Bons os frutos, com as flores
Lindas? Nau de baldear

Entre ditos e gracejos.
Faca puxo de vapores
Mil, mas feitos a bosquejos.

Autor: Edigles Guedes.


Regato



Regato que chora
As lágrimas frouxas;
E brinda-me risos,
Escárnios tão roxos,

Que deixam-me fútil.
Nariz desempino,
Pensares rumino.
Me queima na boca

A mágoa de peixe
Mirrado. Faleço
Por dengo de broto

Ou mina faceira?
Assaz lisonjeira
Canção desabrocha…

Autor: Edigles Guedes.


Amor



Cambaio, deito
Por sobre relva,
Se bem que leito
Melhor seria.

A gota pinga,
A chuva xinga,
A folha vinga,
A dor à míngua.

Amor à língua.
Amor sacia,
Amor à selva

De pedra rude.
Comigo peito
Avém; ilude!

Autor: Edigles Guedes.


Aperto



Um hausto grande,
Que sorvo, breve,
E tenho pressa.

Viver carece
De curto dito
Ou longo mito?

Torcer as grades
Que prendem brados
De nós cifrados?

Jazer em leito,
De largo — lago
De sono fundo.

Caber em peito…
Aperto, pago.

Autor: Edigles Guedes.


Pejo



Te amo sem pejo.
Por quê? Simplesmente
Te amo; carente
Que sou de teus beijos

Na minha faceta
De bruto, sem zanga.
O brio na gaveta
Escondo; jamais,

À mostra, eu trago…
E perto de ti,
Senhora, eu vi,

A cor colibri,
Nos olhos comi…
Te amo demais…

Autor: Edigles Guedes.


Ao Caminhar




As flores, aos poucos,
Fenecem nas ruas.
Calçadas me gritam;

Lamentam as dores
Por mim: um tão podre
Ninguém de sapatos

Puídos, surrados
Por vida de cão,
Que vira a lata
Em cada esquina.

E, melro que não,
Me torno um canário
De país olvidado,
De préstimo alado.


Autor: Edigles Guedes.

Quesito: Gato



Um gato me galga…
Um bicho trombudo,
Com mimo troncudo,
Capaz de arrepios

No peito da gente…
As quatro canelas
Provocam canseiras
E diz-me asneiras,

Ao pé de ouvido…
A boca boceja,
Ronrona: cereja

Que lambe sua pata
Andeja. No rabo,
Solfeja, me acabo…

Autor: Edigles Guedes.


Quimeras, Ficção




Quimeras flutuantes,
Que dão-me muito gosto
À boca degustante!

Os sonhos já vetustos
Estão. O que comento,
Em noites vãs, sozinho,
Sentado no terraço

De casa, com cachorro,
De viés, olhando, manso?
Cadeira de balanço,

Embal
a-me no colo!
O dedo, quieto, coça
Cabeça fatigada…
Ficção desdenha,
troça!…

Autor: Edigles Guedes.



Venturoso



Então, pareço venturoso?
Se vago reto por estreitos
Os mares, nunca navegados!
Caminho triste por estrada

Capaz de muito fustigar.
O Sol castiga: judiar
De quem exposto à tentativa

De risco, agrura, provadura.
E sou da grade, fechadura?
E sou do grito, mexerico?
E sou do fito, maçarico?

Por causa disso, me desvelo
Um melro: canto! Me revelo
Um fone sempre bloqueado?

Autor: Edigles Guedes.


Chita



De ti, retirado,
Por mãos do Destino,
Avante prossigo…

Estrada, perigo,
O vão desatino
E tudo mais sofro!

O pé calejado
Por rua descalça.
Tropeço realça
O grande desgosto.

Aflige sentença
Por Dama sem crença
Na minha desdita.
Saudade por chita!

Autor: Edigles Guedes.


Moça na Teia



A noite padece
Lamúrias remotas
E, dentro do peito,
Saudade chilreia.

Amor que carece
De livros e prece…
E tu bisbilhotas
A tez poliglota,

Que fala do leito
De mãos deleitosas.
Espalhas as rosas

Por onde desfaço
O sórdido laço
De moça na teia.

Autor: Edigles Guedes.


Cadente



Estrela cadente,
Que rompes aurora,
No dia carente
De tua demora.

Jamais me deslembre…
A baba de cego
Carrego, sem guia…

E tu, demorado
Amor, esqueceste
De mim, que sou falho,
Que sou desgrenhado,

Por vida biruta?
A gota de sangue
Me pinga da face…

Autor: Edigles Guedes


Regaço



Suspenda os passos…
Suspiros que bailam
Em boca tardia…
Confesse, me ama,

E vamos à cama…
Espera os laços
De surdos abraços…

E, hoje, me brindam
Os beijos de lábios…
Os ditos sábios,
Ao pé de gemido…

Regaço cerzido
À nota bravia,
De quem te colhia…

Autor: Edigles Guedes.


Bolacha



Bolacha silente,
Salgada ao dente,
Que dói ao sabor,
Castiço amor.

Existe vesano,
Que grita: — Esconde
O fruto por onde?

E tudo é dano
Ou vil desengano,
Se há um afago
Anexo ao pote?

Bolacha que trago
À mão e naufrago,
Cavalo ao trote.

Autor: Edigles Guedes.


Aquário de Vida

À mercê dos favônios, Bisviver jigajoga, Bajogar a conversa, Retisnar os neurônios… Lida que se renova. Quem me dera essa trela… Fá...