Natal, o Outro



Me cumpre pedir
Bocado de paz.
Menino Jesus,
Atende a prece.

Me cumpre sentir
Pecado voraz?
Menino e Deus,
Por ti esmorece

O homem tirano!
Que posso o dano
E faço, mas sano

Injúria com pranto?
Sossego que canto
Ao pé sacrossanto!

Autor: Edigles Guedes.


Professora




Lembro-me da trança comprida.
Sempre com sorriso na boca.
Sempre agastamento de pouca
Serventia. Fronte lambida.

Mãos que me bendigam, garridas.
Sempre com luzente nos olhos.
Sempre paciente. Piolhos
Que catava. Unhas rendidas.

Voz que me caricia, florida.
Sempre com aroma na pele,
Que evolava. Meiga partida.

Inda que me cegue, retida
Sempre na memória, impele
Gentileza menos bramida.

Autor: Edigles Guedes.


Por que Amo?



Por que amo, com tal força,
Estas flores
calcadas,
Por pés incautos, tardos,
Que dano
s me entrelaçam?

Por que amo? Por feitio,
A meia adriça, bêbado
Por perfume; fastio;
A química do cio,

Que me
dispõe na esquina
Da ilusão, por teus beijos;
Teu bailar de felina;
Fera punge
traquejos.

Por que amo, com tal força
Cilígera,
essa moça?

Autor: Edigles Guedes.


Água e Vida



Água esmorece sobre a pia:
Fio fininho, pois, se finda;
Té não sobrar sequer suspiro
Da torneira, que ora sofria…

Sofria de saudade tão pingue…
Por bocadinho, quase o queixo
Cai da fronte, intacta de lágrimas…

A vida desabita as páginas
De tais lamúrias encardidas,
Por fábula acúlea das mágoas…

A vida, de quando, deságua
No leito de outra vida idília;
Não perde tempo com lamúrias,
Antes, engendra mais a vida…

Autor: Edigles Guedes.


Osga


Nenhuma nesga de céu azul,
Somente a manhã de tenebrosa,
De nuvens a brincar com os cravos
Do céu de outono, com folhas secas,

Mortinhas da silva, silvo solto —
O vento nubífugo assobia
Pianíssimo contigo, tardio,
Exíguo, com gastura pra dar,

Vender, comprar e desperdiçar.
Nubífero trovejou suas mágoas.
Imbrífero calejou suas tréguas.

Estou gafo pra acabar com isso:
O tudo que me restou no copo
De cólera, bêbado por osga!

Autor: Edigles Guedes.


Norte


Por que me sorris,
Com teu riso sáxeo?
Se você não quis,
Jogue-me no aéreo

Do avião bimotor;
Só assim de dor
Serei mui feliz!
O mar: bem-me-quis;

Onde meu delírio,
Gentileza-lírio,
Deixa-me com ares

De frutos. Pomares
Nadam por esporte?
Amarrei meu norte?

Autor: Edigles Guedes.


Momento



Sim, a muita firmeza
Não é sinal de sempre
Tê-la ao meu lado, como
Braço no abraço longo.

Você, minha boneca,
É fastidiosamente
Linda, com suas mãos
Postas na cerviz, nãos

Ditos de quando em vez,
Breve passava o mês,
Cálido amor refaz.

Esse momento jaz
No passado longínquo,
Vive em meu crânio oblíquo.

Autor: Edigles Guedes.


Suspiro de Memória



Manifesto sinal
Que trem descarrilhou…
A embusteira ampulheta
Do tempo, tão solerte,

Não se prostrou… final
De jogo, terminou
A mariposa, peta
Da noite que perverte,

Voa sonsinha pra cima
Da luz incandescente.
Coitada, não tem forças!

Que avexado aproxima
O derradeiro e ciente
Suspiro de memória.

Autor: Edigles Guedes.


Resta-me



Quão graúdo é fugaz desarranjo!
Não do meu intestino frouxo,
Que fica pesado de fezes,
Mas nunca pesado de amor!

Resta-me o sorriso, que arranjo
Num canto arnês de lábio roxo.
Desfaço o laço de talvezes,
Quando desce o tardio sol-pôr.

Resta-me o debique, como arte
De amor frustro ou fúria medida
Nos dedos da mão comedida.

Resta-me o silêncio, como arte
Que restruge nos meus ouvidos,
Agora, moucos, por olvidos.

Autor: Edigles Guedes.


Rouca



Nunca chegarei ao cabo
Dessa grandiosa façanha…
Que delícia favorece
O meu arcabouço? Tece

Cá, dentro de mim, o fio
De Ariadne… Algum Teseu,
Ingrato, olvida a promessa:
Salvaguardar-se da pressa,

Que tudo consome em boca
Do caminho escasso e seu.
Não sustento desafio,

Parto pra cima, me acabo
No cabo da faca, assanha
Meu juízo, lavando rouca…

Autor: Edigles Guedes.


Lábios de Bombom



O célico prado…
Lampírio que voeja…
Um sonho de alado
Ou mimo de sonho?…

Caiu-me na palma
Da mainça um chuvisco;
Quedou-me um suspiro
De manso encantado…

Retiro da palma
De minha cabeça
A ideia de um beijo…

Estalo de lábios —
Bombom, hum! à beça,
Que tanto me acalma!…

Autor: Edigles Guedes.


Mastigava



Ah! caso eu pudesse… mastigava-te todinha,
Como se mastiga um fruto suprimido pelo
Prazer inconfesso de mastigá-lo, bocado
Por bocado, em boca sequiosa por um beijo.

Sem embargo, tu não te rendes aos meus desejos
Mais rútilos, de fruta caída do pé de árvore,
Despedaçada aos teus pés de anjo, tão docemente
De lascívia aos desfrutes dada, devoradora.

Ah! caso eu pudesse… mastigava-te, frutinha
Por frutinha, como se colhesse uma flor, feita
De amor e artimanhas muitas, a carícia eleita,

O dengo escondido na víscera de perfeita
Criatura: mulher, ainda que demais aflita
Ou afoita, suscetível aos temperos da cólica.

Autor: Edigles Guedes.


De mãos Dadas



Contemplo oblíquo mar…
Continua salgado
No seu vaivém desnudo,
Tal qual bicho; de par

Em par, sorve bramido
De leão na bravia
Pedra. Inda que almadia,
Freme nuvem; rochedo

Lastima seu calvário
Por não se circundar
Com onda, no minério.

Que furo! caso amar…
Pode rochedo e mar
Viverem de mãos dadas?…

Autor: Edigles Guedes.


Você Sorriu



Não sei que prazer
Me deu? Na manhã,
De hoje, tudo rútilo.
Um pássaro canta:

Está alegre ou triste?
Talvez ele cante,
Porque sim existe.

Prazer com que anda?
Por que você está
Tão vexado? O Sol
Não largou o fulgir.

A rua, calva, sem
Pingo de pé ou gente.
E você sorriu?

Autor: Edigles Guedes.


Baba de Caim



Retiro um papel cru da gaveta,
Está sujo, empoeirado pela
Sarjeta do tempo obscuro, além;
Distante, escuto um coro de améns,
Entoados pelas muitas cigarras,
E cada uma espantando os seus males.

O papel em si, é simplesmente
Um papel comum, sem os rabiscos,
Sem escritos ou linhas de pautas,
Mas suspira, como vivo fosse.
Tenho tosse, resquício de tarda
Pneumonia, que afetou meu filho.

As Horas gotejam tão demente
A derradeira baba de Caim!

Autor: Edigles Guedes.


Tobogã



Serpente aflitíssima,
Que faz-me sonhar
Com muitas as águas
De cuia ou de mar.

De súbito, breve
Caroço de criança
Retumba o seu tombo
Em arco de aliança:

Humano ser vivo
Com jorro, miríades
De pingos altivos,

Que brincam de líquido
Espesso ou partidos
Cristais abismados.

Autor: Edigles Guedes.


Conto de Outono



Uma folha crócea que dança,
Ao sabor do vento aguerrido…
O vento muge: — Não se canse!…
Vá devagar que a vida é pouca!…

A folha, furibunda, risca
Um sorriso mordaz no rosto,
Joga para longe um chuvisco,
Que teimava em cair naquela

Tarde fria, de outono lívido.
Quase pondo a língua pra fora,
Disse a folha, de cenho vívido:

— Cuide da sua vida, pois cuido
Da minha, é que lhe digo. Nisso,
Veio o inverno: a folha finou.

Autor: Edigles Guedes.


Laço e Beijo



Se me estimas,
Não te estimo;
Se me sonhas,
Não te sonho.

Somos duas
Partes
todo
Níveo. Tuas
Mãos enlaçam

Embaraço
Sou carente
De teu braço.

Sei que aguente
Miúdo laço
Beijo quente!

Autor: Edigles Guedes.


Esquina e Gula



A noite rubra

Que sonho fino!
Que paz de fruta,
Com tanto mimo!


Cansei de ti,
Dos mimos vários;
Cansei de mim,
Dos vis contrários.

E sei que sou
A dura vírgula
E pranto tal.

Mas, deito; estou
Esquina
a gula
No grão final.

Autor: Edigles Guedes.


Livro, Soprano



O prazer corpóreo desse livro,
soprano!
Apalpar a carne ou couro, quando encapado
Explorar a letra impressa, de saltimbanco
E ninar em dedos lívidos o tamanho

Das palavras, ora níveas, ora sombrias

Acalento, meu regato muda-se em berço
Pra acolher desejo, fato estranho, inconfesso,
Que prolongo, incertas horas ficam de brisas,

O deleite frui, fruição de quem se enamora
Por estreito corre-corre, como formigas
Em fileiras
dó, desgosto forte, mitigas.

E mastigas dote, posse dada, demora
Do contato feito, mãos em dança por folhas.
Entretanto, sofro muito gozo, às escolhas.

Autor: Edigles Guedes.


Verso e Fera



Não sei se chego;
Não sei se fico;
Não sei se digo;
Não sei se mexo.

Esqueço, nisso:
Que brota dentro
De mim, narciso
Ou riso mero?

E fujo, visto
Que rude sigo
Por ru
ela aceita.

No peito, surge
O verso
ruge
A fera
eleita.

Autor: Edigles Guedes.


Bucho e Bomba



E xingo a mim mesmo

Careço, decerto,
Do livro descrito
A sete tinteiros;

Com mãos de palhaço,
Tentando, num traço,
Fazer uma graça
Ou simples piada.

Mas, sigo na raça
De cão
Decifrada
Poesia? Quem dera!

Na jaula, ribomba
O bucho, com fera
A fome. Que bomba!

Autor: Edigles Guedes.


Mente Vitrola



O vão desperdício
De léxicos, cios
De gatos nas telhas.
De fato, nas quelhas

Embrenho-me, sigo
O signo de amigo,
Na falta de flauta,
Pra canto e consolo.

O brado de nauta
Me faz acordar.
Comprido de sono,

Me volvo a xingar:
Que vá, carambola!
A mente vitrola.

Autor: Edigles Guedes.


Pensares de Fortes



A brisa, em seguida,
Embirra, faz bico,
Assenta sua língua
Pra fora da boca.

Eis o Eu desnutrido,
Sem trens de ninar,
Sem mãos pra nadar,
Ainda no berço.

Me sinto o sentido
De afável ternura,
Sem dita bravura;

Sonhando, alicerço.
Pensares, doridos;
De fortes, vividos.

Autor: Edigles Guedes.


Sussurro e Murro



Um ventilador
Resolve ficar
Quieto, caluda!
Um vento de dor

Dissolve finar
Seleto; boazuda
Germina na flor,
Gerando sabor

Aos puros de dor.
O gesto, que Amor
Me grela o ferrolho,

Que ponho de molho.
Escuta o sussurro
De boca no murro!

Autor: Edigles Guedes.


Suspiros e Papiros



Domingo qualquer

De brisa hedionda
Soprando na cama.
O dom de mim quer,

Detido à fé, onda
Logrando mar. (Lama?)
A tarde, com tédio,
De triste remédio,

Se dava ao bom luxo

De tardos, os passos;
De tigres, os lassos;

Nos dados, que puxo.
Refém dos suspiros,
Contém-me os papiros.

Autor: Edigles Guedes.


Siso e Riso



A rocha esbraveja
Palavra imbecil.
A roda espumeja
A lavra sem til.

Senti que passado,
Com ímpar em mim.
O senso perdi,
Compasso de alado.

O pássaro lindo,
Revista de moda.
O pasto florindo,

A vista acomoda.
O siso, topei;
Em riso, abispei.

Autor: Edigles Guedes.


Atônito Abdômen



O fascínio deste castelo dura por séculos a fio
De navalha, corta em pedaços maduros o fruto do frio,
Reflexão das
dúcteis correntes, que abrem as portas do castelo
E seu fosso, visto que lama
olorante e esgoto (de tão tolo!)

Navegavam já por aquelas bandas, uns tantos vomitados.
Cravejava o Sol as pelúcias de suas luzes agonizantes.
De manhã, solfeja um canário, perdido nesses horizontes.
Enquanto isso, vejo um mané-magro, raquítico, demitidos

Os esgares tardos de ordinária tartaruga, com seus rogos,
E caçado as benevolências e benfeitorias da ruga;
Pois, restou-me vastos os mares da consciência, que me cega!


Longe, ao longe, ruge alguns ventos destemidos por um pascigo,
Sinto a relva-grude-e-fantástica assenhorear-se de mim

Neste agora, justo agora, lembro-me que sou atônito abdômen!


Autor: Edigles Guedes.


Você Suporta



No Livro Santo está escrito,
Sim: “Suportai-vos uns aos outros”.
Ah, Deus! Meu Deus! Meu Deus! Meu Deus!
E eu que não suporto um sorriso

De gato ou sequer um latido
De cão? Se alguém me olha de lado,
Atravessado, qual fiofó
De calango, sou bem capaz

De irromper a Terceira Guerra
Mundial, só pra ver o cabra
Se borrando de medo, ali!

Mas, você? Suporta esse mundo,
Como um Atlas sustenta o mundo
Em seu dorso
— a mais tão divino?

Autor: Edigles Guedes.


Amor e Segredo



O lido segredo,
Que cuido, me agrada…
A estante coxeia…
A dúvida, em cachos,

Viceja: — Secreto,
Por quê? Se descrito,
Me vinga uma rédia!…

Da aljava, Cupido
Recolhe uma flecha;
O dedo, raspado,
Atira, com fléxil

De braço: o aturado
Amor, por mais árido
Que seja tal rédea!…

Autor: Edigles Guedes.


Pai que Sonhei



O quepe, na cabeça, a mimar.
O sabre descostura com a mão.
Tapete, que sondava cafuné,
Agora, decretava um revés.

O sonho que retém o caminhar.
As nuvens, no terraço, pipocar.
Bigode inquieto… Outorgar
Uns ares de fidalgo… Desmentir

Desenho de cachorro ardiloso.
E, presto, arrebento o sorriso.
Estendo as mãozinhas ao longevo

Idoso. Gratifica gargalhada.
Com riso, circunscrevo abobada
Palavra, que me leva, buliçoso.

Autor: Edigles Guedes.


Flor de Cloro



Desperto, em plena
Manhã, com planos
De ler um livro

Fugaz, que lavro
De mui pequeno,
Em dia quínio


Contém na caixa:
Dilúvio, setas,
Detido coxo.
E tu, que hesitas,

Desfazes riso,
Sentires dores,
Pensares
flor
De tanto cloro!


Autor: Edigles Guedes.


O Licorne e a Espada



O livre licorne
Surfava por raios
Argênteos da Lua.

A tarde: de carne
E poços; de arreio
Soberbo; sem freio.

De
pranto, passava
O lívido; sova
Estruge na salva
De palmas, no silvo

De
próprio ninguém.
Espada de gume
Agudo e sem lei
Resvala
fio frio

Autor: Edigles Guedes.


Incômoda



A líquida Hora, coagulada no ferver do bule,
Me põe tão cabisbaixo, por pensar no verso líquido,
Que não vige por páginas e páginas além!…

Mas, antes, fica embatumado na garganta, sem
Saída por cano ou por linguagens distintas… Físicos
Sentidos, por obséquio, sua Morte nefasta pule!…

Os lânguidos gemidos do meu cérebro confrangem

As tísicas moléculas da fervura no bule,
Com água desperta às três horas da manhã de agosto…
Prossigo na tarefa ingrata de muito rancor…

Me causa palor nas faces túrgidas, de proposto
Depósito de amarguras, que me ferem e rugem…
A mosca, incômoda e formidável, minhas mãos tangem;
A dita, contudo, insiste: putrefatos de amor!…


Autor: Edigles Guedes.


A Areia e o Ciúme



A areia, que range a saia roçagante,
Anui este ciúme bimaculado,
Que aflora no meu sentido, bronzeado
Por riso de suspeita mirabolante.

Presumo, néscio, todas as coisas tolas,
Tais como: o raio que te parta, o trovão
De léxicos tonitruantes, o baião
De dois ou três, em triângulo, beiçolas

E línguas, ávidas e imundas, se juntas,
Em treda traição, o sangue jorrando,
Um tiro seco nas aflições defuntas,

Revólver raiva, cospe fora esse fogo
De quem cúpido quer o corpo, chorando,
Porém, olvida-se da piedade em jogo.

Autor: Edigles Guedes.


Leio Virgílio



Roma castigada por fogo
Surdo, chamas tão movediças,
Nero a perseguir os cristãos,
Veleidade vã do poder,

Consome que a lucidez mais
Humana, em desvario mortal
De déspota sanguinolento,
Crivando as noites de horror.

Enquanto isso, leio os meus versos:
Os bárbaros não se inclinam
Modismos aos civilizados.

Nestes versos, barbaramente,
Vejo-me escritos. Ao final,
Leio Virgílio, de tropeço.

Autor: Edigles Guedes.


Escorrer dos Segundos



Esse escorrer miúdos dos Segundos,
Perante o cabreiro do relógio,
Me deixa vivaz, bastante porto,
Onde tais barcaças fazem pose

De peixe, em aquático motejo
Ou vaca provida de umas tetas,
Ou respostas,
moídas as perguntas…

Esse escorrer fluido dos Segundos,
Perante os ponteiros do relógio,
Me deixa loquaz, bastante torto,
Tal como Bentinho penteava

As de Capitu, suas madeixas,
Ouvindo murmúrio de umas queixas
Tão tênues, tão vagas, tão viçosas

Autor: Edigles Guedes.


Andorinha



Chutei um balde
com Horas:
Um pontapé retumbante!…
E cavalguei por esquinas
E ruas, todas pintoras

De angústias chocas, bastantes
Sequiosas… Mágoas sentidas
Por quem caminha nas quinas
De mesa de escritório,

À caça de algum poema,
Jamais escrito na noite,
Que cedo se avizinha…

Ah! doce andorinha, minha
Parceira de quarto e sala
De mundo lúrido, cala!…

Autor: Edigles Guedes.


Concedo-te um Beijo — Dois



Concedo-te, legitimamente, um belo beijo,
Desses que ficam dependurados nas gravuras,
Por trás da porta de casa, só para o deleite
Do dono, e de mais ninguém; pois, ninguém saberá

Do beijo que se esconde por trás da porta absorta
De casa, de tão sigiloso, e secreto, e simples,
Capaz de arrebentar meus lábios de ardores mil.

Um beijo, concedo-te!… Arde o lume do desejo
Nesse legítimo beijo — desentupidor
De pia das mágoas e lágrimas do Destino,
Que se diverte ao provocar bílis e dores

Incontáveis, como titeriteiro com sujas
Marionetes, todas manipuláveis a cordas
E madeiras, sem leis, sem regras, sem compaixões.

Autor: Edigles Guedes.


Concedo-te um Beijo — Um



Concedo-te, encarecidamente, um beijo;
Não o concedo como quem concede esmolas,
E anuncia aos sete ventos do oeste e leste,
Com sete trompas dos anjos do Apocalipse,

A sua grande conquista, a proeza inaudita.
Isto, jamais eu faria; sequer em pensar,
Brota em meu âmago tal sentimento fugaz.

Concedo-te, secretamente, um lídimo beijo;
Porquanto somente em secreto é que os beijos
Carecem de assaz concessão, de quem os concedem;
Ainda que sejam beijos fugazes e inauditos…

Desses que surgem de manhã, em ato concebido,
Pra logo se esvair na face de quem os recebeu,
Sem os deleitar, sem os notar, sem gota de pejo!…

Autor: Edigles Guedes.


Derreti



Claro, arranquei, por detrás da roseira,
Um belíssimo espinho dos olhos teus;
Todavia, esqueci-me de arrancar
Um pequenino cisco dos olhos meus.

O dito espinho cravejou no meu dedo;
A princípio, doeu; tempestuou, sem medo,
A minha fronte contra
o espinho na carne.
Com ternura própria de mulher trigueira,

Você deitou
suas mãos lívidas nas minhas
Mãos, e bravamente sorriu para mim…
Você desovou o nocivo espinho abaixo…

Por pouco, arrepiei carreira; mas, você,
Sempre você, assoprou-me o dedo sofrido,
Fez-me um
denguinho qualquer, me derreti!…

Autor: Edigles Guedes.


Sofá



Deitado nos braços…
Cativo por laços…
Afável, capaz
De tudo, apraz!

Delícia: regaço
Gentil me congraço.
O crivo mordaz
Que mágoa me traz.

Regalo-me, caço
Amor no terraço.
Calor, almofadas.

Recordo: desfaço
Qualquer embaraço.
O conto de fadas.

Autor: Edigles Guedes.


Versos que não Cabem na Garganta



Há versos que não cabem na garganta!…
São tão compridos, demais tão compridos,
Que estouram na página de papel almaço,
Em franco olhar de atirador de elite:

Bum! um projétil de palavras sonsas —
Ora miúdas, como formiguinhas velozes;
Ora graúdas, como açúcar no açucareiro;
Ora medianas, como estatística

De dados assombrosos, esquecidos
Na prancheta do tempo remontado.
Há versos que não cabem na garganta!…

São cruéis demais para caberem todos
Na minha mão — mão tão grande quanto o mundo!…
E o que dizer para caberem na garganta?…

Autor: Edigles Guedes.


Nem Todos os Dias são Maio



Nem todos os dias são maio…
Há dias que a queixa explode,
Há dias que o choro se alegra,
Há dias que os vivos padecem,

Há dias que os mortos remoçam,
Há dias que o tédio demora
E não quer sair nem com a gota-
Serena! E você fica triste,

Igualzinho ao peixe torto,
Debruçado nas grades tortas
Do aquário, esperando a morte

Da bezerra, que não vem; vem?
Aí, uma lágrima quer brotar
Em seu rosto… Mas, você é forte!

Autor: Edigles Guedes.


Carrossel



Cavalos que giram
Em torno do eixo.
Os olhos que miram
As luzes e queixo.

Destranco as mãos;
E elas se vão
Em voo sarcástico.
Sorrir de ginástico

Sorriso. Monárquico
Me sinto. Anárquico
Menino de asas.

O peito em brasas.
Primaz diversão,
Em terno verão.

Autor: Edigles Guedes.


Bem-te-vi — Dois



Bem-te-vi, ó meu bem-te-vi!… Por que choras assim?
Eu sou teu irmão de bico e cântico, repito,
Pois, as mesmíssimas palavras frequentemente;
Não me assombro com isto, ao contrário, desencanto

Varre o meu íntimo, em cabal tristura; suplanto
Tudo com sorriso sonâmbulo pelos dentes
Da boca, adormecida pelo meu canto tão fácil…
O canto não é ledo, nem triste; antes de tudo,

É somente sóbrio, como sóbrio são as manhãs
De Primavera no Sertão adentro ou afora;
Maiormente, sóbrio e seco; tão seco, que amarga

A língua do dizente, expondo o retirante
Ao risco de viagem renhida para longes
Terras, tão distantes do lar e do meu cantar!…

Autor: Edigles Guedes.


Bem-te-vi — Um



Bem-te-vi, ó meu bem-te-vi!… Por que choras assim,
Repetindo as palavras fúteis, trombeteando
De mim? Dando notícia de quem jamais te quis
Bem ou mal. Ó passarinho! que cozinhas o tempo

Com língua de portas abertas ao mundo, farto
De injustiças e outros infortúnios pessoais.
Quem me dera sonhar com um planeta melhor,
De ventura e de paz infindas, longe d
a guerra

E seus rumores, longe dos azares em dança
De sina, longe dos lances de dados ou jogos
De força bruta, só pra ver quem é o mais forte,

Longe da destruição em massa das florestas,
Longe, muito longe, daqui, tão longe daqui,
Que sou capaz de alcançá-lo num simples pulo.

Autor: Edigles Guedes.


Febre — Quatro



Tenho febre. Tenho febre. Febre
Com pintas de tais letras maiúsculas,
Capaz de rilhar os dentes. Fome
Finita veraz febre lateja…

Janela veio bradando por febre…
E tenho as mãos amargas, os pés
Tão tristes de febre, que me arde
Na boca, na língua, nos devassos

E vãos olhos, na velha e tardia
A tez, na fronte de paquiderme.
Confesso que gosto de escrever

Com febre; todavia, o que se escreve
Com febre, quando se está são,
Não vale sequer tostão furado..

Autor: Edigles Guedes.


Febre — Três



Nesse torto instante, tenho febre.
Não sei se existo; para que existo?
Se a Existência me contamina
Com febre hidrófoba, ciciando

De febre curva na minha vida…
Esta febre que, com depressivo
Olhar, me bota em canto de quarto,
No aguardo possível de um surto

De cólera ou será de loucura?
Já não sei o que sinto, sentido;
Já não sei o que penso, pensado;

Já não sei se minto, quando calo
A voz piedosa do coração.
Ah! o elixir que me deixa são!…

Autor: Edigles Guedes.


Febre — Dois



Soa-me leve a frase febril: — Febre!
Nesse instante, tenho febre. Febre,
Não levem ao hospital; aliás, médico
Algum poderá curar-me… Cura,

Pra quê? Se anticorpos demais saram
As feridas pútridas, as chagas
Vorazes. Vivência tão humana…
Com faltas irrepreensíveis; vago

Modelo de bipolaridade,
Que se perde divido entre isso
E aquilo, discórdia raivejando

Dentro de mim, o Inconsciente
Mais que consciente me devorando,
Como a Esfinge de Édipo brando.

Autor: Edigles Guedes.


Febre — Um



Tenho febre. Tenho febre. Febre.
Nesse instante, tenho febre. Febre.
Nesse firme instante, tenho febre.
A febre de todo o mundo basta?

Basta-me a febre incessante, muda,
Que tenho — galopante cavalo
Que corre, corcoveia, ao passo,
Ao trote, sem rédeas ou bridão,

Que carrego comigo no corpo,
Já cansado de tantos perigos,
Já cansado de tantos abrigos,

Desta vida de poucas palavras,
Deitadas num caderno qualquer,
Já cansado de soez desatino.

Autor: Edigles Guedes.


Manhãs



Amo as manhãs que tecem as plácidas nuvens no céu…
Amo o salgueiro imponente, embalado pela canção
Vã de ninar dos ventos sibilantes; tardo, pois não…
Amo as tardes sonolentas de brinquedos senis…

Quem escondeu o meu trenzinho de metal tão barato?…
Quem me ofendeu com sorriso desmazelado, sem tato?…
Quem me desceu a mão, com violência, fazendo-me triste,
Como triste é o canto da araponga?… Minto? Me riste?

Amo o tinir inexorável do ritmo do relógio…
Amo o frigir dos ovos numa frigideira qualquer…
Amo o pingar das águas no chuveiro, banho me quer…

Quem escondeu o meu queijo de Bodocó, desacato?…
Quem me ofendeu com esgares de palhaço?… Caminha pato,
Jeito de quem desengonçado repara o cós da calça…

Autor: Edigles Guedes.


Acerca de Girassóis



Os girassóis são satélites do
Sol;
Pois cada qual gira derredor do
Sol,
Por movimento contínuo do terreno
Coração — servo da sina tão serena.

Ah! eu, que não nasci girassol, engreno
A máquina silente, que me condena
A viver por esquinas e ruas sujas,
Nas sarjetas do Ser, nas valetas tortas

Do Nada; enquanto, claudicante, me fujas
D
as minhas mãos, que nem um rio de mortas
Nascentes! Tu, somente tu, vasto Amor!

És capaz de me pôr de espantos, quando,
Cá, assisto um girassol, em pleno calor
Do meio-dia,
ninar a terra, cantando.

Autor: Edigles Guedes.


Meu Filho



E fazia-me de cavalo crédulo, pelos prados
Da América; enquanto deleitava-me com as Horas,
A passearem por ruas mofinas — longas demoras!
Que infindas Monotonias partiam ao meio alados

Versos! Indignos de constarem numa ata de reunião…
O que dizer de constarem num livro aberto ao sol?
Brincávamos de esconde-esconde em terra imaginária…
Jamais a Terra do Nunca haverá de se comparar

Aos campos, viçosos e verdejantes, que nós sonhávamos…
Havia fartura e teimosia, como Outrora;
Porém, o mundo era mais justo e tínhamos teu sorriso

Para alegrar o tempo de sol-posto, no horizonte…
Meu filho, enxota, põe para fora os olhares duros,
Há tantas terras para desbravarmos jungidos, juntos!…

Autor: Edigles Guedes.


Mover Estrelas



As mágoas que esbocei, e os sonhos que sorri!
Não passa de sobejo a quimera almejada,
Na tarde de verão, rebuçado no alpendre
De minha moradia, infensa ao suprassumo!

Com botas da memória intensa, claudicante,
Repiso a vexatória estrada, que encontramos
O beijo de vitória, após a quotidiana
Peleja — transitória, ainda que tardia!

Ah! como gracejei de mim!… A mesma língua
Me pune com bocejo… E rimos, decorosos,
Da fina e conhecida história de vilão.

Delíquio — encafurno o ciúme caprichado.
Veraz, me enganaste? Ou lume das estrelas
Deixou-me tão soturno, a ponto de movê-las?

Autor: Edigles Guedes.


Covarde



O gáudio dos dias de Outrora,
Recorda-me o quengo demente,
Por esta cadeia docente:
— Quimera, por nome e batismo.

Cadeia temente de carnes
Que vagam por água sinistra:
Carbono e anágua registra,
Em túrbida vida, covarde!…

Confesse querença de sobra
Por Dama franzina, de modos
Apáticos, sonsa; mas obra

Calor demasiado, com pernas
Oblíquas de trêmulas, ternas
Palavras gaguejas, hibernas.

Autor: Edigles Guedes.


Verso Martela



Um verso martela
Na minha cabeça,
Não leva consigo
Balela, nenhuma.

Não traz o refúgio
Ao pé de si mesmo.
Avante prossegue,

Tal como paquete
Que singra o Oceano,
Por simples brinquedo.

Um verso martela,
Sem pé ou cabeça…
Conduz-me em abraços
Amigos, mas tardos…

Autor: Edigles Guedes.


Colo e Sina



Mui cuidado:
Colo e sina!
Brisa meiga
Queima rosto.

Chã canela
Deixa marca.
Mar parcela
O Eu por vários

Meses findos.
Há sorrisos
Lindos, bem-

Vindos! Colo
Rindo, gamo!
Sina, bramo!

Autor: Edigles Guedes.


Biliro




Que prende o fero
Cabelo, mantido
Por belo e tido
Por muito; tolero.

Olívia Palito
De tão magricela.
Da cor de baixela,
Que deita no fogo.

Premente, hesito.
Um beijo que rogo;
Me dás o biliro.

O signo sugiro.
Madeixa segura;
Mas peno secura!

Autor: Edigles Guedes.

Pulga com Carinho



É pequena a pulga, escura e pula;
É treteira e suga o sangue pio.
Ah! debruça, pura e sã: desdita,
Feito carne na panela, frita.

Ah! veneno das manhãs de inverno!
Neve alguma cai no seio materno
Do sertão, que cheira ao nu licorne…

É miúdo o meu carinho, pune
Tão pertinho; vai, mansinho; pisa
Dengo; move mãos, divã, mulher;
Torce pernas, pés. Nariz requer

Cheiro tão sublime, minha Alteza!
Pode não… Esconde, minha bela,
No tugúrio! Ou: fera engole, anela…

Autor: Edigles Guedes.


Olhar



Restou-me o frígido olhar
De quem friamente me pisou.
Palor grelou na minha pele.
Pavor soçobra no meu sangue.

O sério reina no semblante
De quem redime o caminhar
Das Horas, dentro do espaço
Finito, assaz do diminuto

Segundo, sem torna-viagem.
Passagem? Só de ida sem volta.
Por quê? Ninguém compra o Passado,

Que alado, voa por montanhas
Do tempo Outrora, com seus cimos.
A cisma abrolha em quem cismou.

Autor: Edigles Guedes.


Chorar a Rosa



Há de chorar a Rosa!
Que se perdeu no flanco,
Esquerdo e cru, da vida…

Há de chorar, bradai!
Por Rosa tão pequena…
Que mais valeu a pane
No coração amargo…

Há de chorar a Rosa!
Como a vã mazela,
Fixa em jardim de males…

Há de chorar, bradai!
Por Rosa tão serena…
Mudo, jamais profane
A cova; então, cativa


Autor: Edigles Guedes.


Cobiça e Querença



Da cobiça, o látego me assola;
Entretanto, o pávido me some.
O chicote devora-me de esmola.
O macérrimo corpo… que demole

As paredes havidas de concreto…
No profundo de espírito, que increpa,
Me censura por ditos impropérios,
Os quais nunca deviam se espargirem.

Mas, detém, de sensato, o deletério
Sentimento; é justo, sob regime,
Os quilinhos restantes no pandulho?

A candura de mãos voluptuosas…
A brandura com pés de virtuoses…
A querença por Dama, que perdure!

Autor: Edigles Guedes.


Coragem



Atino com Existência, que redime
A mágoa, no exclamante calabouço
Do peito, num aljube de bramidos…
O plácido Minuto, que me oprime

O cálido desejo de formosas
As mãos, em madrugada de aflição…
O nítido paquete me comprime
O tórax de Esperança, que fugaz

Navega pelas sete freguesias…
Retumba forte assaz Monotonias
Das Horas claudicantes em relógio,

Com ácidas manobras dos ponteiros…
Coragem de Pintinho em galinheiro,
Enquanto Malandrim anda à espreita…

Autor: Edigles Guedes.


Um Beijo na Fronte



Regaços mil de maravilhas
(Que gozo, mais!), nas redondilhas
De abraços vários… A Senhora
Cativa em braços namorados…

Me põe de lúcidos os joelhos
Aflantes… Pernas que suportam
O peso ingente das blandícias…

As mãos escorrem no espinhaço,
Que nem a mágoa no chuveiro…
Um banho para refrescar
A carne, cheia de avidez…

Mas, onde guardo as pudicícias?…
Um beijo casto afivelei
Na fronte afável do meu bem…

Autor: Edigles Guedes.


Diamante



O bem que me queres é de cristal:
Que tão delicado fica, que meigo
Se quebra; partido, risca sossego
Por prêmio de tarde arisca. Navego

No regaço de mulher fascinante.
No terraço de felina e bacante
Me encaixoto por inteiro, delírio;
Me sepulto de janeiro a janeiro.

Suspiro… Deleite foi de metal
Fundido no peito frívolo e negro
Diamante… No leito vago restou:

O lençol alvinitente; a ternura
De ferido coração; o rabisco
De canção desaprendida, calou.

Autor: Edigles Guedes.


Perplexo



Parece pássaro encantado,
Em fonte de água deleitosa,
Sequer observa em redor,
Atento ao ato de sorver.

O líquido magro e fino
Escorre por bico de hino:
A sede gulosa ao viver.
A cúmplice fronte com dor,

Por não amar completamente
O instante, cujo demorado
O beijo deixa-me perplexo.

O riso me sonda cabal.
E vivo me queres de mau-
Humor ou pavor de fritura.

Autor: Edigles Guedes.


Debaixo do Salgueiro



Desfolhas um sorriso
Por dentro das roseiras…
A fronte me desperta,
Debaixo do salgueiro…

Esplendes um sorriso…
Me punge os ouvidos
Com muitas das asneiras,
Que ouves nas cercanias…

Laceras a paciência
Com beijo ardiloso…
E tentas disfarçar

Modesto pensamento…
E sarjas o meu peito
Com unha, por lazer…

Autor: Edigles Guedes.


Peito Magoado



Olhos fitos em rosto soberbo;
Surdos, rimos da prova sem dor;
Duros mimos em colo travesso;
Mudos tidos os lábios reversos…

Como falas de vil desamor?
Há bafejo de biltre meloso?
Tinges face de rúbida cor;
Calas gesto nos ares; quimono

Cai bocado, de flanco, silente;
Tapas boca com dedo em riste.
Certo, boa sentença brandiste?

Cá, que nunca! Largaste pingente
Dado… Feres o peito magoado,
Como fera com dente crispado!

Autor: Edigles Guedes.


Todos Ouvem



Quem me dera um mocho cantasse
“O Danúbio Azul”! Plenitude
De prazer voraz abriria
Os sentidos, já adormecidos

Pelos sãos! Às vezes, pruridos
Brotam sonsos, vale nenhum…
Todo siso cai do primeiro

Degrau — tropeço mui valente.
Sorriso invade rosto, crente
Que abafa zoada firme e forte
De queda livre. Soalho ruge,

E todos ouvem tua queda
Tonante: rio de muitas águas,
Cachoeiras rijas, lisas mágoas…

Autor: Edigles Guedes.


Ideia de Cólera



Martelo a mesmíssima ideia…
Em noite morena, penhoro
Coragem nas guelras de peixe…
Com língua-de-sogra no bolso,

Caminho por rua dourada,
À cata de coisa perdida.
Alguém, que deseja o alento
Da sorte, da sina mofina,

Destranca sorriso de escárnio.
Aceno com quengo de calmo;
Embora, por dentro, me bramo

De dores, assaz dissabores.
A gota-serena me pinga
A cólera — crê-me que ginga!

Autor: Edigles Guedes.


Diante o Mar de Sargaço



Mar de sargaço salgado,
Onde mergulho as mágoas,
Onde me banho nas águas,
Onde me queimo, afogado?

Nada percebo: confetes
Ou serpentinas? Paquetes
Singram os mares, ao longe.
Vivo no claustro, qual monge,

Tido por sábio, nos ermos
Ou nas cidades cifradas.
Vivo com muitas ciladas…

Entre findável madorna
E concebível bigorna,
Fica tangível nos vermos…

Autor: Edigles Guedes.


Falsos Pensares



Vivo com falsos pensares;
Risco tormentos; cegares
Piscam os olhos, de manso;
Subo montanha de um lanço;

Tenho depressa como alvo;
Vejo a neblina, ressalvo;
Como pensar, se ciúme
Rói por demais a matéria,

Feita de carne com ossos?
Rude e suspeita venérea
Rompe os grilhões de colossos.

Brota pacato azedume.
Tudo depõe-me faminto;
Tudo de pânico sinto.

Autor: Edigles Guedes.


Dizes Adeus



Quando me dizes adeus,
Algo me põe de sandeu…
Mágoa será que rompeu?…
Trégua na língua gemeu?…

Houve um desvairo nos mares…
Ah! se me louca brigares,
Serei feliz com a sina;
Porém, você me previna,

Caso desgoste de mim.
Eu, que desvivo sem ti,
Decido ter o adeus
Debaixo, rude, dos pés.

Antes chorar com desgosto,
Que ver partir ao sol-posto.

Autor: Edigles Guedes.


Vida Sonha



Desdobra as asas,
Em voo largo…
Partiu amargo
O peito alado

De Dama linda.
Verão de sol
Ardente, finda

O dia, fado
Sorri. Lençol
Me cobre o lado.

A língua abrasa…
— A vida sonha
Em psiu de fronha…

Autor: Edigles Guedes.


Mágoa



Sombrinha tácita, na mão,
Girava aquém, girava além…
O pé, depressa, faz alguém
De leso — cisma que brotava

No meu regaço; vegetava
Por siso afora, de bufão.
Gozar o beijo por vintém?
Sonhar que pode; intervém,

Porém, donzela com vergonha.
Acanho viça; mas, proponha
Um dócil ósculo na fronte,
Àquela, não que desaponte…

Justo é que pague com chorar,
Quem tanta mágoa deflorar.

Autor: Edigles Guedes.


Aquário de Vida

À mercê dos favônios, Bisviver jigajoga, Bajogar a conversa, Retisnar os neurônios… Lida que se renova. Quem me dera essa trela… Fá...