Coração Ferido por um cão Perdido II


Tu eras peludo até que dizer basta;
Levantavas as patas tristes, gastas;
Amor davas, querer sem recebê-lo
Em troca, por ser esse ato mui belo;

Lambias o meu rosto em afago fora
De hora, embora enjeitasse eu no agora;
Que sempre balançavas, cheio, o rabo
— Eras tão alegre quão caldo de quiabo;

Tu, só tu, manso e amigo, cá, guardava-me
Do trovão, do ladrão, qualquer enxame
De abelha mui carnívora ou vexame.

Quem me dera que Amar tão simples fosse
Assim!… Aí, veio um carro, vrum, vrum!… Foi-se
O cão, catarro qual sem brusca tosse.

9-2-2015.

Coração Ferido por um cão Perdido I


Se, de Amor, coração jaze ferido?…
Direi que não!… Quiçá decepcionado
Por esse lago claro que indeciso
— Tua partida de cão abandonado…

Sem assombro, achei-me compelido
A adejar por esquinas, ruas do bairro…
Machuquei as tampinhas, voei narciso,
Espanquei moribunda Lua de siso,

Estacionei pulcrícomo meu riso
Na garganta grandiosa de Gargântua…
As estrelas que riam da desnua

Agonia, sofreável: querer ver-te;
Embora, no meu imo, a ave verde
Dizia-me da razão que não, conciso.

8-2-2015.

Goiamum


Heráldico cavaleiro medievo e cavalo
De oito patas e táticas. Tanque de guerra,
No teatro de ações, dentro do manguezal, que erra
Entre a lama suja e roto lodo a desgostá-lo.

Eis que azulado crustáceo rompe a lama preta.
Com as suas desiguais pinças, caça, a garfo e faca,
O de comer. Ressentido, a barcaça fraca
De carapaça revira o lixo e mutreta,

À procura de sustento do tempo social.
Goiamum só degustou da carne o seu duro osso;
Goiamum provou deserto, só, por manancial.

Eu vejo de goiamum, hoje, o quanto eu sou: fosso
De fossa é minha vida; ando sem ponto cardeal;
Como detritos, e lixo fezes, desde moço!…


7-2-2015.

O Infausto Navio


A que horas evacuei cais do Recife?…
A ponte movediça de aço e ferro,
Xucro manguezal, cal torpe, o meu erro,
A minha transgressão, o apelo, o arrife;

Tudo, o simples riscou tudo: ficou pra
Trás. Onde está o relógio de algibeira?
Cá está o pincenê sem eira nem beira?
Onde o supermercado foi sem compras?

Tudo, o simples riscou: cá, soçobrou
Neste mar tenebroso de sargaços.
Hoje, sou pé de peixe com puro aço.

Cabine, Capitão que tresdobrou
A ordem: — Seguir avante! Vá defronte
Ao mar pasmo!… Zarpei eu, ao horizonte…

7-2-2015.

Em pia sem Tampo


No mar trívio, o sol vejo a despertar,
Pintando de azul o horizonte em tela.
A Noite foi deveras chuvas tempestuosas;
As águas bravejavam tardias e impetuosas…

A vela com o vento vivia a flertar…
A Fúria cega, dor de gema amarela,
Queria porque queria tragar os mares,
Setenta de bocejos… Leme, ao léu, aos ares,

Voou… O infausto Navio foi-se a decertar
Com a Sorte e Azar — Cavalo alvo sem sela
A correr embestado por asfalto ou campo

De hipocampos… Eu, sim, deixei-me alertar
Por vãs rimas e estrelas sem rútilas trelas:
A vida — eis o naufrágio em pia sem tampo!…

7-2-2015.

Mundo Ogro


Majestosa, subias as boas escadas
De Jacó… Jubilosa, as escaldadas
Anáguas, lindas, desciam, fás ao vento…
Fazia frio de feio… Tremulento,

Teci mãos em nutriz e bom quadril,
Envolto em seda púrpura com anil…
Os pasmos degraus, sós, qual boquiabertos,
Lançam olhares cínicos, incertos…

Não reparo no sevo falatório
Das portas… Dou atenção ao vil desvario
Das impiedosas Horas: são fugazes!…

Eu mapeei, mocorongo, o teu corpo,
Qual cartógrafo age em globo ogro…
Ah, Horas! são indomáveis ares ases…

7-2-2015.

Sorte Retina


Se amei?… Quem desagrada a Rosa biltre e ciosa?…
Eis que tão certamente acolhi seus espinhos,
E abrolhos, e bugalhos, e alhos, e ninhos…
Não sei amar metade e por mente ociosa.

Mas a leda Fortuna assoprou penosa
Desdita em minha lida. Que ais!… Desadoro
Lágrimas minhas secas… Que ais!… Afervoro
Soez razão sem razão — pedra tênue e danosa.

Embotada por pia frustrada e antifaz…
Rosa jeremiou, Rosa!… de navegar foi-se;
Partiu — qual galo a golpe de contorce foice…

O Amor se faz com Amor que cedo se desfaz;
Pois, de Amor em Amor, a roda e triste Sina
Transforma a pulcra Rosa em sua Sorte retina.


1-2-2015.

Aquário de Vida

À mercê dos favônios, Bisviver jigajoga, Bajogar a conversa, Retisnar os neurônios… Lida que se renova. Quem me dera essa trela… Fá...