Pena Ancha


Edigles Guedes

Máquina do tempo parco…
O meu cérebro maquina
A mão sutil de vil barco,
Que trafegava na esquina

De algodão-doce com pouco
Sal no quotidiano louco…
Que mão lamenta esse fogo?…
Que desce aos prantos, aos rogos!…

Voo tal qual arco sem flecha…
A chave estúpida fecha
A porta tão lentamente…

Ando tão de mim descrente…
Que piso na bola murcha
E caio que nem a pena ancha!…

4-3-2012.

Sonho de Vinil



Edigles Guedes

Eis um sonho de vinil,
Tatuado no meu peito
De cavalo varonil…
Troto, troto, sem jeito

Por campos verdejantes…
Por vales tão contentes…
Navego (tal como antes)
Por entre cegos entes,

Que só vêm seus quereres…
Navego – barco que sou! –,
Singrando os caos cárceres

Das mil águas infindas…
Vã quimera que passou…
Que sonho acordado, ainda…

27-2-2012.

Larga Âncora



Edigles Guedes

Uma borboleta anil
Caiu, pois caiu pelo funil…
Mas não foi borboleta;
E, sim, uma corveta

Que naufragou no torto
Mar sem navios, sem porto…
Manhã de fevereiro,
Faz frio, tal qual chuveiro

Com água mui frígida…
Caminho… Viagem de ida
Sem volta: oh! reta, oh! curva…

Sem despedida turva…
Corveta larga âncora…
Feliz, coração chora!…

26-2-2012.

Dor-dragão


Edigles Guedes

A cadeira surda não sabe exprimir
A fragrância que se evola do átomo…
Amor, cujo Amor cuinca e me faz fremir!…
Eis que tremo! eis que frêmito! tal como

Verde vara ao sabor do vácuo vento…
Ah! se minha Dor transpassasse dores
Da parturiente ao dar à luz, num lento
Valsejar de sofrimento sem flores!…

Oh! Dor inaudita que retrocede
Para assomar mais forte: cão com sede
Do meu sangue equestre; cão co’ atroz fome

Da minha carne – esta mendaz síndrome
Da galopante invenção… Cruel pesadelo!…
Dor-dragão sem pílula ou perdido elo!…

26-2-2012.

Aquele Sorriso Manco



Edigles Guedes

Desabotoa aquele sorriso manco, quando
Chega da cidade industriosa e sem tamanho…
Sem alarde, sem um oi sequer – urso pando
Vivendo no zoológico: gaiola com banho –,

De mansinho para não magoar os ouvidos
Macios de meu amorzinho… que dorme às bandeiras
Desfraldadas. Ouço vaidade de pruridos:
Um salto alto após outro é desvestido; beiras

De precipícios são ditas ao lustre mudo;
Os calos latejam suas dores… Ela coça
Meu pescoço-telescópio com beijo ancudo.

A Lua (singela e bela) cabe em nosso quarto!…
Uma sinfonia de grilos corteja a moça
De vermelho; enquanto eu lagarto tal qual parto!…

25-2-2012.

Naufrago-me na Superfície


Edigles Guedes

Páginas e mais páginas, folheadas
A inconsútil dedo, vagam por horas
A fio, na escrivaninha tão recheada
De livros imaginários… agora!…

Eis uma escrivaninha inexistente
Povoando a memória indelével de mim!…
Quem me dera! se eu pudesse navegar
Por entre as escumas, co’ odor de jasmim

A perseguir minhas ilusões!… Vagar,
Quiçá, por livros, que férteis são terras
De ideias mirabolantes, minha mente!…

E o vento sopra no meu rosto… Serra
Vai, monte vem… Montanha vai, planície
Vem… E eu naufrago-me na superfície…

23-2-2012.

Descrição Marítima



Edigles Guedes

Ribombou o velho mar!… Tuas tênues ondas
Tecem fios de fiandeira na escuma atroz!…
Voa ligeiro e mais que veloz o albatroz,
Qual o sorriso de tua La Gioconda!…

Ostras perambulam por entre rochas
Anônimas!… Sociedades de corais
Pintam de Picasso os azuis anormais!…
Anêmonas acendem tortas tochas

De neurotoxinas… Peixes naufragam
Nos frios d’águas… Caranguejos afagam
A textura insondável do rochedo!…

É noite e o mar baloiça as velas, toscas
E trêmulas, voejam… Foscas moscas
Brincam com a lixeira do penedo…

24-10-2011.

Aquário de Vida

À mercê dos favônios, Bisviver jigajoga, Bajogar a conversa, Retisnar os neurônios… Lida que se renova. Quem me dera essa trela… Fá...