Pernas em Canto de Sereia

Edigles Guedes

Que cálculos esquizofrênicos em frenéticas
Pernas são esses? Pluviais pernas, que ablaquecem quebrantos
De meus polutos gritos; carnívoros ouvidos
De mulher fumegante em cama de lençóis lúbricos!…

Que lua ocídua reluz no céu atônito? Que venusta
Estrela resplende, no azul da noite, suas lágrimas
De cristais, que se eivaram pela madrugada? Cismas —
De insônias maldormidas — aquecem pernas astutas,

De tanto vagabundearem em casa patética!
Pernas pteridófitas ceifaram almos prantos,
Acalentaram-me o cansaço dermatológico

Do dia azedo que nem limão azedo. Que canto órfico
Maculou minhas pernas gralhas? Canto prazenteiro
De sereia: cantas comigo debaixo do chuveiro!...

24-3-2010.

Coração Despedaçado

Edigles Guedes

Coração despedaçado não te preocupe!
Eu hoje recolho os teus pedaços, cacos de mim,
Que estou aos pedacinhos — tão diminuto! Trupe
De malabaristas sequestraram o jasmim,

Que coloria a minha vida destrambelhada!…
Coração despedaçado salta! pulando
Pela minha boca, e diz àquela trigueira
O quanto te quero, minha flor de amendoeira!…

Eu tenho andado ensimesmado, atabalhoado;
Mas, jamais me esqueço da minha flor de jasmim...
Ela tem encantos mil, ela me faz feliz!…

Coração, vivo com a cabeça agrilhoada
Nesse lenço de cheiro, que ela deixou. O beliz
Lenço — ao sorvê-lo, sinto-me co’ este frenesim!…

27-3-2010.

Monólogo com um Palito de Dentes

Edigles Guedes

Palito de dentes, o que estás fazendo
Aí, dentro do paliteiro? Resignado
Estás com tua magreza? Mui bem, decerto
Algum bicho carpinteiro, guapo, aguado,

Pintou o sete contigo. Meu precolendo
Amigo, me não tenhas por um decreto
Desazado!… Eu sou tão carente de amigos
Verdadeiros, tal como pena ao escrutínio

Deitada. Palito, eu vou passear contigo.
Quem sabe assim esquecemos o infortúnio,
Que nos abateu tão de supetão. Amargo

Fado o nosso! O teu: de viver enjaulado…
O meu destino: ela prometeu-me largo
E deu-me estreito viver abandalhado!…

27-3-2010.

Augusto dos Anjos

Edigles Guedes

Foi enxuto, meu desditoso contentamento!
De um macérrimo esquálido ímpar. Violáceas
Olheiras deformavam o cavo retrato
Dos olhos de vizinho, ave sem fareláceas

Asas! Somente imaginação ele portava
Com asas de estro virente, bem comparável
À lua em seu passeio noturno. Perambulava
Com sua clavícula arqueada — de indefensável

Gado desmamado — pelos vãos de Pau d’Arco.
Seus sapatos puídos tagarelavam. Corpo
Quebrantava-se em sua omoplata; estrumes parcos

Alegravam seu viver. Que pena! a matéria
De verme, que eras tu, findou-se! Metacarpos
Tornaram-se lixo, em petição de miséria!…

28-3-2010.

Senhora com Blandícias

Edigles Guedes

Coração estouvado, estou triste pela noite —
Que cai no chuveiro de pingos roríferos
Da aurora — no campo de pensamento. Açoite
Do guizalhar dum grilo vergasta alífero

Ser: a minh’alma, presente divino! Oblíquo,
Olho para fora do tarro em que coabito
Co’a Natureza das horas. Um flexíloquo
Regougar de coruja espavoriu (súbito)

As corujinhas em seu grabato entanguidas.
O tempo flui lentamente pela ampulheta
Do relógio cuco na parede estúpida!

Minha melancolia vai riscar de felícia;
Pois, o dia já vem e a noite, à boa-fé, não aguenta
O fulgor de minha Senhora com blandícias!…

28-3-2010.

Pés Apopléticos

Edigles Guedes

Pés pancreáticos pisam em partidos
Pontos pândegos; pômulo pomposo
Paira no pascigo — pasto impávido
Com perigos perdidos. Prestimosos

Pés, pábulos, perambulam pacatos
Por primores de apriscos. Pés, pálidos,
Passeiam por puberdade de tal pato
Pateta. Céptico épico proibido!

Pés apopléticos perturbam parvos
Painéis de patrícias palmas! Paródia:
Pedro Primeiro, príncipe protervo!

Pés plácidos, pardos (panegíricos
Crépidos), pobres palermas! Paciência
Em papel de pânico pacífico!…

28-3-2010.

Rosto de Rodofícea

Edigles Guedes

Rosto rúbido: raro ramo rico
De rabdovírus; rubro romântico,
Que raiva em roda-viva rutilante,
No rocio reptante e resfolegante!

Rosto a rabavento no rodomoinho
Rochaz, robusto, ríspido, risonho;
Romance rústico de riólitos rios,
Que ringem seu ribaldo regalório!

Rosto de réptil roçando (revoa rua
De revindita) reverbério; recua
Sua régua — recobro recomendado.

Rosto de rodofícea recolhido,
Roaz; rima rija, ridente rinorreia.
Recrudesce o rosto em ruda ritmopeia!…

28-3-2010.

Aquário de Vida

À mercê dos favônios, Bisviver jigajoga, Bajogar a conversa, Retisnar os neurônios… Lida que se renova. Quem me dera essa trela… Fá...