Chã de Lama

Edigles Guedes

O estrambótico gel dental
Sorri enigmático na pia.
A pia, informe, de frio metal,
As metáforas, arrepia.

A água – salobra e tão morna –
Desterra tantos pesares.
A inundação, agora, adorna
Meu coração cheio de ácares.

São ácares essas pústulas
Abertas: Amor indolor!...
São ácares essas pílulas

De microscópica color,
Que me sente na minh’alma
Tão demente – chã de lama!...

14-8-2011.

A Sala

Edigles Guedes

A sala respirava opressa, adormecida.
Clarice Lispector

A sala partida, sem meio
Ou começo e fim, desata
Melancolia – sua desdita!…
Eu perco-me em breve recreio

De alma e amargura… Que pejo
É esse na maçã que brota
Do rosto!… Oh! física e torta
Linha de harpa com arpejos

Anis!… Por que dilata nó
Em mim?… Se está nos cafundós
De mim essa voz, que rouca

E desafinada, evoca
A ti – cruento e desleal Amor!…
A vida é temor, só tremor?…

13-8-2011

Feche a Porta

Edigles Guedes

Feche a porta, antes de sair!…
Que loas ventos a levem
Para longe!… Vai partir?…
Que parta como a nuvem,

Sem deixar a Saudade
Incrustada no peito
De quem fica… Maldade,
Sim, é largar o leito

Com cheiro de perfume
De noites tão cálidas!…
Hoje, sou um belo estrume,

Dejeto humano, prumo
Sem pedreiro, sem corda!…
Nau a navegar sem rumo!…

13-8-2011

Procura-se um Vaga-Lume

Edigles Guedes

Pergunta-se assim: como é o vaga-lume? Responde-se: ele desaparece.
Clarice Lispector

Noite adentro… Um Vaga-lume
Insone inventa de piscar
Suas lanternas de brasumes.
Enquanto, lá fora, há o riscar

De pó de gizes no quadro
Negro da paisagem fútil…
Sem régua, esquálido esquadro
Foge pela folha inútil!…

À mesa, a brisa sussurra
Nos meus ouvidos o clarão
Do dia, que raia numa surra

De ventos e tempestades…
Procuro o Vaga-lume. O boião
Da Lua diz-me que é debalde…

13-8-2011

Soneto do Desencanto

Edigles Guedes

O riso desfez-se em pranto!...
A mosca pariu lamento!....
A hora consumiu meu canto!...
O lápis sorriu, sarnento!...

A mesa chorou seu tanto!...
Lua sem sal, sem sentimento!...
A brisa sobraçou o quanto
Pôde o descontentamento!...

O frio franziu seus sobrolhos,
Que nem a alma com os joelhos
De Amor no peito calado!...

O rio mingou que nem mingau;
Que nem sopa dessa mágoa
De Amor tão desmesurado!...

12-8-2011

Gaivota sem Préstimo

Edigles Guedes

Gaivota sem asas, por que perdeste o abraço
Pneumático das horas imberbes?… Solertes
Mãos procuram-te por entre a selva de laços
E o meu coração empedernido — rocha inerte!…

Gaivota sem asas, sem abraço, para onde
Vais tão triste e solitária?… Se inda não sabes
Navegar o horizonte do amanhã sem frondes;
Se não sabes do perigo atroz, que se esconde;

Se não sabes da ave de rapina, que come
Vorazmente teus ovos inermes em ninho
Esconso; se não sabes o quê (em vão) consome

Teus pensamentos de incólume passarinho;
Se não sabes da bocarra de leão sem juba!…
Gaivota: que és uma sem préstimo jujuba!…

2-3-2011.

Tristes Tisnes

Edigles Guedes

Onde estão as prosas, que me enviaste?…
Em que mastro ou estrela longínqua
Evaporaste o meu sorriso
De Patinho Feio e seu qua-quá?…

Sim, perdi tuas cartas de valor
Transcendental!… Não li os bilhetes
De Amor, que pesaram com fervor
No meu vaso de ramalhetes!…

Eu sou um caco de amores, frente
À frente, que eu não vivi!… Silente,
Sigo por lago de tais cisnes

Negros e águas negras e turvas!…
Claramente, não sei que curva
Ou esquina, eu perdi tristes tisnes…

1-3-2011

Aquário de Vida

À mercê dos favônios, Bisviver jigajoga, Bajogar a conversa, Retisnar os neurônios… Lida que se renova. Quem me dera essa trela… Fá...