Sofá



Deitado nos braços…
Cativo por laços…
Afável, capaz
De tudo, apraz!

Delícia: regaço
Gentil me congraço.
O crivo mordaz
Que mágoa me traz.

Regalo-me, caço
Amor no terraço.
Calor, almofadas.

Recordo: desfaço
Qualquer embaraço.
O conto de fadas.

Autor: Edigles Guedes.


Versos que não Cabem na Garganta



Há versos que não cabem na garganta!…
São tão compridos, demais tão compridos,
Que estouram na página de papel almaço,
Em franco olhar de atirador de elite:

Bum! um projétil de palavras sonsas —
Ora miúdas, como formiguinhas velozes;
Ora graúdas, como açúcar no açucareiro;
Ora medianas, como estatística

De dados assombrosos, esquecidos
Na prancheta do tempo remontado.
Há versos que não cabem na garganta!…

São cruéis demais para caberem todos
Na minha mão — mão tão grande quanto o mundo!…
E o que dizer para caberem na garganta?…

Autor: Edigles Guedes.


Nem Todos os Dias são Maio



Nem todos os dias são maio…
Há dias que a queixa explode,
Há dias que o choro se alegra,
Há dias que os vivos padecem,

Há dias que os mortos remoçam,
Há dias que o tédio demora
E não quer sair nem com a gota-
Serena! E você fica triste,

Igualzinho ao peixe torto,
Debruçado nas grades tortas
Do aquário, esperando a morte

Da bezerra, que não vem; vem?
Aí, uma lágrima quer brotar
Em seu rosto… Mas, você é forte!

Autor: Edigles Guedes.


Carrossel



Cavalos que giram
Em torno do eixo.
Os olhos que miram
As luzes e queixo.

Destranco as mãos;
E elas se vão
Em voo sarcástico.
Sorrir de ginástico

Sorriso. Monárquico
Me sinto. Anárquico
Menino de asas.

O peito em brasas.
Primaz diversão,
Em terno verão.

Autor: Edigles Guedes.


Bem-te-vi — Dois



Bem-te-vi, ó meu bem-te-vi!… Por que choras assim?
Eu sou teu irmão de bico e cântico, repito,
Pois, as mesmíssimas palavras frequentemente;
Não me assombro com isto, ao contrário, desencanto

Varre o meu íntimo, em cabal tristura; suplanto
Tudo com sorriso sonâmbulo pelos dentes
Da boca, adormecida pelo meu canto tão fácil…
O canto não é ledo, nem triste; antes de tudo,

É somente sóbrio, como sóbrio são as manhãs
De Primavera no Sertão adentro ou afora;
Maiormente, sóbrio e seco; tão seco, que amarga

A língua do dizente, expondo o retirante
Ao risco de viagem renhida para longes
Terras, tão distantes do lar e do meu cantar!…

Autor: Edigles Guedes.


Bem-te-vi — Um



Bem-te-vi, ó meu bem-te-vi!… Por que choras assim,
Repetindo as palavras fúteis, trombeteando
De mim? Dando notícia de quem jamais te quis
Bem ou mal. Ó passarinho! que cozinhas o tempo

Com língua de portas abertas ao mundo, farto
De injustiças e outros infortúnios pessoais.
Quem me dera sonhar com um planeta melhor,
De ventura e de paz infindas, longe d
a guerra

E seus rumores, longe dos azares em dança
De sina, longe dos lances de dados ou jogos
De força bruta, só pra ver quem é o mais forte,

Longe da destruição em massa das florestas,
Longe, muito longe, daqui, tão longe daqui,
Que sou capaz de alcançá-lo num simples pulo.

Autor: Edigles Guedes.


Febre — Quatro



Tenho febre. Tenho febre. Febre
Com pintas de tais letras maiúsculas,
Capaz de rilhar os dentes. Fome
Finita veraz febre lateja…

Janela veio bradando por febre…
E tenho as mãos amargas, os pés
Tão tristes de febre, que me arde
Na boca, na língua, nos devassos

E vãos olhos, na velha e tardia
A tez, na fronte de paquiderme.
Confesso que gosto de escrever

Com febre; todavia, o que se escreve
Com febre, quando se está são,
Não vale sequer tostão furado..

Autor: Edigles Guedes.


Aquário de Vida

À mercê dos favônios, Bisviver jigajoga, Bajogar a conversa, Retisnar os neurônios… Lida que se renova. Quem me dera essa trela… Fá...